JUROS
TIRÂNICOS 4
Em sua quinta reunião do ano e quinta na gestão Lula
3, o Comite de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC)
decidiu reduzir em meio ponto percentual (0,5) a taxa Selic (Sistema Especial
de Liquidação e de Custódia), denominação dada para a taxa básica de juros no
Brasil. Foi a primeira vez que houve redução da taxa neste ano, retomando o
patamar de junho de 2022, em 13,25%. Porém, há exatos três anos, em 5 de agosto
de 2020, o Copom anunciava uma taxa de 2% e a economia do país não evaporou.
A ATA DA 256ª REUNIÃO
O Copom reunido 1º e 2 de agosto de 2023, dessa vez
com dois novos diretores, Ailton de
Aquino Santos e Gabriel Galípolo, ambos indicados pela gestão Lula 3, divulgou
sua ata dia 8.
Como de praxe, lembrou que no plano internacional não
houve mudanças significativas desde a última reunião do comitê, com a economia
mundial em desaceleração e com os principais bancos centrais do mundo focados
em promover a convergência da inflação para as suas respectivas metas.
Sublinhamos que o FED (equivalente do banco central nos EUA) e o Banco Central
Europeu (BCE) estabeleceram uma meta inflacionária de 2% ao ano. Para nós, o
Conselho Monetário Nacional, em decisão anunciada dia 29 de junho, manteve a
meta da inflação em 3,25% ao ano para 2023 e indicou que para os próximos anos
será de 3%, até que seja alterada.
Em várias passagens a Ata reiterou que o objetivo é
conter a inflação e o meio para obtenção da meta é promover uma política
contracionista. O que isso significa? Em linguagem direta, contrair a atividade
econômica e fomentar o desemprego. E pelo resultado da reunião, esse objetivo
está sendo alcançado.
No item 6 da Ata, o Copom admitiu: “(...) que não
há evidência de pressões salariais elevadas nas negociações trabalhistas”
(p. 4), certifica que a política recessiva favorece o desemprego e encurrala os
trabalhadores a ponto de inibir a organização de greves em defesa do salário.
Mais abaixo repete: “Ao fim, concluiu-se
unanimemente pela necessidade de uma política monetária contracionista e
cautelosa, de modo a reforçar a dinâmica desinflacionaria.” (p. 4). Conferida credibilidade ao que está dito pela
Ata, os dois novos diretores indicados na gestão Lula 3 estão de antemão
alinhados com a direção do banco, pois o documento afirma que por unanimidade a
política contracionista responsável pelo desemprego deve prosseguir. Em outra
passagem, foi reforçada a ideia de coesão de propósitos: “Foi unânime o
entendimento de que, independentemente da composição da diretoria colegiada ao
longo do tempo, deve-se garantir a credibilidade e a reputação da Instituição”
(p. 5).
Para os diretores do Copom, responsáveis pela condução
da política de favorecimento do capital financeiro, a Ata salienta como um
aspecto positivo para a baixa da inflação: “(...) uma desaceleração da
atividade econômica global mais acentuada do que a projetada” (p.5).
Concluem que, em ambas as esferas – nacional e internacional –, reduzir o nível
de atividade econômica é o caminho. Fica evidente que existe uma articulação
global dos bancos centrais para desaquecer o mercado mundial e dessa forma
intimidar os trabalhadores. Não se trata de inferência, mas de uma confirmação
pela leitura da Ata: “Permanece, assim, a determinação dos bancos centrais
de controlarem a inflação por meio da manutenção do aperto da política
monetária por período mais prolongado.” (p. 3).
O
CONTEXTO
Numa análise do primeiro semestre de 2023, o
comportamento da inflação, se comparado com a taxa Selic, vai revelar que o
juro real no Brasil aumentou em termos reais e, por extensão, a renda dos
especuladores. Logo, a redução da taxa Selic em meio ponto percentual não está
em função de auxiliar o governo ou beneficiar a sociedade, mas resulta de uma
queda da inflação que já permitiu grande acúmulo de capital aos rentistas.
Confira na tabela abaixo a constatação de que os juros reais se elevaram ao
longo do ano, portanto a redução da taxa
Selic está alinhada com os interesses do mercado.
O Copom insiste em
defender que o caráter de sua política é contracionista e dela não abrirá mão.
Uma das formas de se evidenciar essa política está no raquítico desempenho da
indústria brasileira. O primeiro semestre de 2023 serve de exemplo: em três dos
seis meses houve retração industrial (janeiro, fevereiro e abril); nos três
meses em que houve expansão, em dois deles (maio e junho) o aumento foi muito
baixo, quase desprezível, ― 0,3 e 0,1 respectivamente. O segmento é o mais
importante e sensível da economia, é o
que melhor remunera e exige mão de obra mais qualificada. Esse quadro reflete a
política do BC conduzida por Campos Neto.
Na véspera da reunião, o
jornal Valor Econômico, de propriedade do Grupo Globo, porta voz do
mercado financeiro, dos megainvestidores e do imperialismo global, em matéria
publicada na edição de 31 de julho,
informou o levantamento de opinião entre 128 instituições financeiras
sobre qual deveria ser a decisão do Copom acerca dos juros – somente uma
defendeu a manutenção da taxa em 13,75 e uma outra não declarou. Aquilo que
pode ser lido como uma matéria jornalística nada mais era que um ordenamento ao
Banco Central sobre qual deveria ser sua decisão. Um total de 99,2% das
instituições validava uma flexibilização da política monetária avalizando uma
queda da taxa. A diferença de opinião recaiu sobre o ritmo e o percentual:
64,6% defendiam uma queda de 0,25 enquanto 34,6% apostavam em 0,5.
No mesmo dia em que publicou a matéria referida acima,
o jornal Valor Econômico manifestou-se e, num editorial despudorado,
revelou o pensamento das classes dominantes do Brasil sobre os problemas da
economia e qual deve ser a principal medida do BC para conter a inflação:
“(...) o mercado de trabalho segue com um desempenho melhor do que o
esperado (...) Representa, por outro lado, um desafio para o Banco Central
baixar a inflação para a meta de longo prazo (...) O mercado de trabalho
deveria se desacelerar, ampliando a taxa de desemprego e o nível de ociosidade,
garantindo uma queda duradoura da inflação.” (Editorial: Mercado de trabalho segue mais forte que o
esperado). Isto é, para a plutocracia que possui as riquezas do Brasil, os
trabalhadores devem ser jogados na miséria. É essa a civilização do mercado.
O infortúnio reside no fato de que setores da esquerda
liberal, amplos setores dos movimentos sociais e do governo seguem acreditando
que é possível uma conciliação com as classes dominantes do Brasil. Essa
política, que não resulta de ingenuidade, mas de crença em pactos de
governabilidade, é filha da perdição.