O
PRONUNCIAMENTO DE HADDAD E O INSUSTENTÁVEL PESO DO ARCABOUÇO FISCAL
Se o regime político do Brasil fosse
o parlamentarismo caberia ao chefe de Estado, diante do resultado das eleições
municipais, solicitar um voto de confiança ou dissolver o Congresso e convocar novas
eleições. Essa é a dimensão da crise – estamos diante de um governo combalido. Ele
segue em corda bamba, ora caindo à direita, ora à esquerda – de um lado a
pressão por aprofundar a perspectiva neoliberal/fiscalista e de outro a tentativa
de se reerguer no apoio popular.
O resultado das urnas foi um cavalo
de pau no PT. A proposta de isenção do imposto de renda até a faixa de R$ 5
mil, promessa de campanha que até agora estava engavetada, é uma forma de se
recompor com uma base eleitoral que não votou no partido. O carimbo eleitoral
da proposta é tal que entrará em vigor somente em 2026, ano de eleição.
Dado que não vigora o
parlamentarismo no Brasil o presidente Lula determinou ao seu subordinado
Fernando Haddad, Ministro da Fazenda, realizar um pronunciamento à nação em
cadeia de rádio e televisão na noite de 27 de novembro de 2024, tentando
conjugar os apertos nas contas públicas com a implementação de uma necessidade
popular de reajuste da tabela do imposto de renda. Quando lembramos que Haddad é um servidor do
governo desejamos ressaltar que não existe uma política do Lula presidente e
uma do ministro. Há um governo e uma só política. Se coerente, podemos indagar.
Na manhã seguinte, dia 28, em
entrevista coletiva o ministro Haddad detalhou alguns itens propostos:
o
Salário-Mínimo terá reajuste de acordo com a banda do
arcabouço fiscal, piso de 0,6 e teto de 2,5%;
o
Benefício de Prestação Continuada (BPC) será
auditado;
o
Abono salarial gradualmente reduzido para 1,5
salário-mínimo;
o
Bolsa Família biometria e recadastramento periódico;
o
Emendas Parlamentares destinarão metade do valor para
saúde;
o
Forças Armadas terá fim da morte ficta
(transferência de pensão aos familiares quando punidos) e idade mínima para ida
a reserva;
o
Supersalários serão rediscutidos;
o
Fundeb incorpora investimentos na expansão das
escolas de ensino integral e inclusão de programa “Pé de Meia” no orçamento do
MEC;
o
Vale Gás será incluído no marco do arcabouço fiscal;
o
Subsídios e subvenções serão rediscutidos;
o
Desvinculação de Receitas da União (DRU) prorrogada
até 2030.
Algumas medidas poderão ser executadas
de imediato pois o governo possui os meios administrativos necessários. Outras demandam
negociação no Congresso Nacional. Aí é imprevisível saber o que pode ser
aprovado ou rejeitado.
A situação resulta do fato de que
todos, tanto mercado como analistas críticos, sabiam que o arcabouço fiscal não
se sustenta. Suas contas não fecham. As medidas anunciadas são tímidas diante
das inconsistências que o marco fiscal impõe. O propósito de garantir e
reforçar a atual política fiscal fatalmente naufragará. Nas palavras do próprio
ministro caso não se comprima as despesas os gastos obrigatórios irão ganhar
maior volume e comprimir cada vez mais os gastos discricionários (livres). As estimativas
de poupar R$ 70 bilhões nos próximos dois anos estão baseadas em projeções otimistas.
O horizonte de ampliar a arrecadação é um pouco irreal. A cobrança de imposto
de renda para ganhos superiores a R$ 50 mil apenas compensa a isenção da tabela
de quem ganha até R$ 5 mil. Isso se a conta fechar.
Devemos educar e esclarecer a
sociedade que comportamento da Bolsa de Valores, do mercado financeiro e
cambial deve deixar de ser referência para o universo decisório da política e
da economia. Foi-se a época em que serviam de termômetro. Antes a especulação
decorria de um mecanismo de causa e efeito em que se perdia na baixa e se ganhava
na alta. Hoje, em função das mudanças tecnológicas e de uma nova cultura as ações,
os títulos e as moedas rodopiam desgovernadamente, visto que, é possível ganhar
na baixa e perder na alta de preços. A lógica do passado mudou. Portanto, o
pico do dólar no dia 27 ao bater em R$ 5,91 antes do pronunciamento está em
função de ganhos de oportunidade. Na manhã do dia 28 bateu em R$ 6. O mercado
sabota a iniciativa do governo. Na queda de braço com o governo o mercado aposta
na desvinculação dos pisos da educação e saúde, essa é a razão da sua revolta. E
isso é imexível.